quarta-feira, 30 de agosto de 2017

L.072.Logos versus logos - Gilberto Gil


Trocar o logos da posteridade
pelo logo da prosperidade

Celebra-se, poeta que se é
durante um tempo a idéia radical
de tudo importar se para o supremo ser
de nada importar se para o homem mortal

Abarrotam-se os cofres do saber
um saber que se tome capital
um capital que faça o futuro render
os juros da condição de imortal
Trocar o logos da posteridade
pelo logo da prosperidade

E assim por muito tempo busca-se
o cuidadoso esculpir da estátua
que possa atravessar os séculos intacta
tornar perpétua a lembrança do poeta

Mas chega-se ao cruzamento da vida
o ser para um lado, pra outro lado o mundo
sujeita-se o poeta a servidão da lida
quando a voz da razão fala mais fundo
e essa voz comanda
Trocar o logos da posteridade
pelo logo da prosperidade

E o bom poeta sólido afinal
apossa-se da foice ou do martelo
para investir do aqui e agora o capital
no produzir real de um mundo justo e belo

Celebra assim, mortal que já se crê
o afazer como bem ritual
cessar da obsessão pelo supremo ser
nascer do prazer pelo social
e o poeta grita
Trocar o logos da posteridade
pelo logo da prosperidade

Eis o papel da grande cidade
eis a função da modernidade

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